Comunicações inscritas
Mesa de Comunicações n.1
Drummond e a vanguarda do Prata
Joaquín Correa (UFSC)
“Modos de ver” se
chamou um texto breve de Ricardo Piglia, aparecido em novembro de 2001 no
vigésimo volume da coleção auspiciada pelo Banco Velox. Abordando a pintura
argentina do período 1810 – 2000, o texto recuperava uma cena de Idle days in
Patagonia, de William H. Hudson que, denominada “la lección óptica”, podia ser “el
comienzo de una historia de la pintura argentina” ou, quanto menos, “una
historia de la percepción y del espíritu de vanguardia” (2001, p. 5). Na cena
narrada por aquele escritor do entre-lugar que foi Hudson, Piglia lê duas
manifestações do mesmo antagonismo, seja o conflito civilização – barbárie,
seja a relação do centro com a periferia, onde se discute para definir “qué es
ver y quién ve bien” e como, ou desde que perspectiva, se configura o real e o
seu estatuto. Será no gesto do gaucho de ir até a carruagem para, no toque,
verificar a realidade daquilo que estava enxergando pela primeira vez, e não na
briga oral da payada nem na resolução posterior do conflito, onde Piglia
encontra cifrada uma variação da percepção a partir da distância e da perspectiva,
fundamentos da estética do limite que, conforme ele, definem a escritura
periférica do Sul e, especialmente e sobre todo, das suas vanguardas. E será,
também, a partir dessa cena de Hudson que Piglia introduz a vanguarda abstrata
argentina. O capítulo de Idle days in Patagonia, onde aparecia aquela cena,
lembra e remarca Piglia, se chamava “Sight in Savages”. A vanguarda abstrata
será vanguardista, sobretudo, pela sua radicalidade e insistência na proposta
de um outro modo de ver ou, talvez, de um modo de ver outro. Um modo de ver
periférico: “Sin la mediación europea, sin su enseñanza y sus instrumentos, el
salvaje no puede ver. La vanguardia periférica, si se me permite hablar así, ha
discutido siempre la verdad (y la prioridad) de esa mirada colonial” (2001, p.
6). Agónico e definitivo e seguindo o modo borgeano de afirmar nos parêntesis,
Piglia acabava por fim concluindo: “(Se es de vanguardia porque se está en el
borde del desierto y se ve demasiado tarde o demasiado pronto lo que se viene)”
(2001, p. 6).
A vanguarda que
menciona e descreve Piglia é a inaugurada pela revista Arturo no verão portenho
de 1944. Duas serão suas vertentes diretas e imediatamente posteriores: MADI e
Arte Concreto Invención. Do último grupo sairá o núcleo fundamental da revista
Poesía Buenos Aires, fundamental para pensar as configurações da poesia
argentina do resto de século XX. Se em Arturo aparecia traduzido Murilo Mendes,
em PBA o fará Drummond. Mas essa não é a sua primeira aparição na constelação
da arte abstrata ou não figurativa do Prata: antes, em 1947 e na revista
Joaquim de Curitiba, Drummund publica um texto intitulado “Invencionismo” onde
se debruça sobre os acontecimentos artísticos portenhos de vanguarda. Os
limites do deserto do Prata, assim, são ampliados e o Brasil entra no jogo da
arte não representativa, não figurativa ou abstrata. O intuito do presente
trabalho é situar essa intervenção de Drummond na constelação Arturo para
começar a situar uma constelação ainda pouco explorada.
Palavras-chave:
Arturo; Drummond; Invencionismo
Entre
bois e tempos: o duplo da poesia em Drummond
Fernanda
Zrzebiela (UFSC)
Se podemos
considerar grosseiramente a poesia moderna pela adoção de uma consciência
necessariamente problemática do mundo, somos levados a admitir que o "meio
do caminho" como lugar sugestivo de sua afirmação não poderia,
ironicamente, ser mais preciso. Não se trata de poesia como ato puro de
linguagem, nem de poesia como expressão de conteúdos sociais ou ideias
políticas: colocado a meio caminho dessa dupla articulação, fraturado entre
essas duas impossibilidades, o canto se cumpre justamente no espaço daquela
indecidibilidade de que fala Blanchot e também Derrida. Quando se aplica tal
reflexão a uma poesia como a de Carlos Drummond de Andrade, somos levados a
pensá-la para a além das contingências históricas que a categorizam, logo de
imediato, como "poesia moderna". Pela leitura que ora se propõe,
parte-se da recepção crítica de Boitempo como obra “reconciliatória”, com o
intuito de se repensar o caminho duplo pelo qual se afirma o seu fazer poético,
oscilando entre morte e renovação, dissolução e transformação. Isto implica
considerar a particular ambivalência de um sujeito aprisionado entre o que se
dissipa e o que fica - a desconfiança em relação ao lirismo herdado também se
inclui aqui - , substancialmente dividido entre uma unidade que não o contém e
uma multiplicidade que o dispersa. Assistimos, então, a uma espécie de
alternância entre dissolução e permanência, duplo motor que move seu fazer poético.
Permanência, contudo, não do ficou, mas daquilo que conseguiu triunfar ou
sobreviver à História. Na situação aporética exemplarmente drummondiana de um
constante choque entre os dois opostos, sem que se alcance a síntese e sem que
se consiga viver com a contradição, evidencia-se, pois, a opção formal de uma
tensão insolúvel própria do indivíduo moderno, posto em sua ambivalência no
lugar do meio, entre mostrar-se e negar a valia de fazê-lo, entre o patriarcal
e o burguês, entre o arcaico e o moderno, entre o apego à tradição e a ruptura
moderna. Ainda que em Boitempo se mostre mais evidente o trabalho de
reconciliação, de reunião dos restos, cacos e fragmentos num todo coerente, não
se pode afirmar que se alcance, de fato, a síntese, pois que a saída do impasse
só é possível no pretérito imperfeito. Da impossibilidade de síntese, contudo,
é que se afirma a própria a poesia: pelo aprendizado da travessia que se
realiza na oscilação das duas estâncias que movem o indivíduo – dissolução e
transformação, ruptura e retorno - , é que se abre a própria possibilidade
poética.
Palavras-chave:
Carlos Drummond de Andrade; Boitempo; Memória
Um
poema inédito de Drummond? E novas soluções
Samanta
Maia (UFSC)
Já quase em 1970,
um Drummond mais maduro publicava, em jornal, um longo poema, o qual era
acompanhado de uma espécie de manual de instrução, que deveria servir de guia
de leitura ao leitor desocupado de domingo. As breves linhas instrutivas que
acompanham o texto permitem entrever a sua aproximação com as cruzadinhas e
exercícios de adivinhas tradicionais em jornais e revistas. Como de praxe,
sucedem o poema as soluções do “passatempo”. O poeta oferece duas “soluções”
para o poema, e, desse modo, consegue colocar em evidência o seu procedimento
de composição: imagens como a de satã de guarda-chuva amarelo e da aranha nua e
tímida são, na verdade, resultado de uma combinação de versos de vários
autores. A proposta desta comunicação é explorar as possibilidades que essa
publicação de Drummond oferece: a começar pelo caráter de “inédito” do poema,
que pode ser afirmado (com base na verificação dos livros individuais e edições
de poesias completas) ou negado (conforme predisposição do próprio Drummond), e
do consequente debate em torno da questão da autoria, que é “resolvida” de dois
modos pelo poeta. Ambas possibilidades são entremeadas pela discussão sobre a
“autoridade autoral” (expressão que não é redundante) dos versos de escritores
canônicos que compõem o texto e pela discussão sobre a legitimidade do processo
e do resultado de determinada forma de composição. O fato de se tratar de um
modo de composição pouco característico da produção poética - embora movimentos
artísticos como o Dadaísmo tenham apresentado técnicas fragmentadoras muito
semelhantes, como o readymade - contribui com a condição de degeneração para a
qual o é relegado o poema. Tal condição impede que o leitor, e o próprio
Drummond, encontrem outras maneiras de significar o texto, ignorando que o que
também pode dar sentido aos elementos textuais é a função que eles cumprem num
arranjo, e não apenas a matéria de que eles são feitos. Por fim, propõe-se pelo
menos uma terceira solução ao poema-passatempo: a autoria de Drummond.
Palavras-chave:
Autoria; Carlos Drummond de Andrade; Poesia.
Muitas
rosas e um enigma a partir de "O relógio do rosário"
Filipe
Manzoni (UFSC)
Muito
já foi dito a respeito da persistência da imagem da rosa na poética de Carlos
Drummond de Andrade como um verdadeiro entrecruzamento dos mais diversos temas
da obra do poeta mineiro, desde sua divisão em duas vertentes em A rosa do povo
– uma marcada pelo engajamento político e pelo contato, em contraste com outra,
marcadamente mais íntima e introspectiva, imprópria ao contato com os convivas
– até sua vinculação a emblemas clássicos do cristianismo bem como da
simbologia gnóstica. No que toca Claro enigma, a crítica ressaltou diversas
vezes (com a exceção do importante estudo de Vagner Camilo) um diagnóstico de
que a rosa que persistiria parecia ter sido a que resiste como emblema da
frustração dos ideais – o “legado”. em Claro enigma, seria a pedra do caminho e
não o sonho aberto “como uma flor” que se revela “apenas sonho e falso” – e não
a do engajamento político tão pungente na obra de Drummond até então. Caberia, porém,
uma ressalva quanto a figuração da rosa no poema que fecha a obra, “O Relógio
do Rosário” – francamente prejudicado na fortuna crítica de Drummond frente ao
seu companheiro de bloco, “A máquina do mundo” –, no qual o poeta parece por em
perspectiva algumas das mesmas imagens de contato que abundavam em A rosa do
povo mais do que operar pelo isolamento que predomina em Claro enigma. Nossa
hipótese, nesse sentido, é a de que “Relógio do Rosário”, além de apresentar um
cenário possível para relermos diversas das linhas de força recorrentemente
associadas à poesia de Drummond – a retomada da infância mineira na figura da
Catedral Nossa Senhora do Rosário de Itabira, a oscilação entre uma “dor
individual” e um gesto político de contato com o outro ou ainda o tom
meditativo que explica sua inserção no bloco “Tentativa de exploração e
interpretação do estar-no-mundo” em sua Antologia poética em 1962 – nos permite
ler uma ponte possível entre dois momentos frequentemente separados na fortuna
crítica de Drummond: as imagens da rosa e a máquina do mundo. É, nesse sentido,
para o relógio, propriamente dito, da Igreja do Rosário que o poeta levanta os
olhos ao fim da tarde, imediatamente após tê-los baixado frente a maquina do
mundo, de maneira que nos interessa observar como esse gesto de “baixar os
olhos” (que, por si só, parece possuir uma fortuna crítica autônoma dentro dos
estudos de Drummond) parece, em geral ser lido desvinculado de sua
contrapartida no poema final de Claro Enigma. Propomos, assim, uma leitura do
poema de fechamento de Claro enigma como maneira de resituar grande parte dos
impasses que o livro ofereceu à crítica drummondiana, bem como ler uma
possibilidade de alternativa ao célebre “baixar os olhos” como ponto fulcral da
obra do poeta.
Palavras-chave:
"Relógio do Rosário"; Claro Enigma; A Rosa do Povo.
Mesa de Comunicações n.2:
Dualidades e aparentes contradições na poesia de Carlos Drummond de Andrade
Julia Schutz (UFSC)
Fruto de leituras e discussões em seminários internos do Núcleo de Estudos Literários & Culturais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) sobre a obra completa de Carlos Drummond de Andrade, esta apresentação procura traçar um paralelo entre dois poemas — “Os ombros suportam o mundo”, presente no livro Sentimento do Mundo (1940), e “Mas viveremos”, publicado no livro A Rosa do Povo (1945). A partir da análise de ambos os poemas é possível refletir sobre a aparente contradição e dualidade drummondianas, sendo não uma problemática exclusiva de um livro, mas que perpassa muitas de suas obras e demonstra o amadurecimento da voz do poeta. Há, assim, a coexistência do pessimismo e do otimismo, a vida e a morte sendo faces da mesma moeda e o sofrimento anestesiado, que beira a indiferença, efeito de experiências coletivas (as experiências do/no mundo) e individuais (as experiências do poeta) modernas, contrastivas em suas dimensões. Tais poemas, de certa maneira, se espelham não somente por evidenciarem essa suposta contradição, mas também no uso de determinadas imagens que revelam um procedimento de mobilização de um eixo temático que alude à possibilidade do “sim” ao lado do “não” por meio da palavra, na poesia. Fazem parte desse procedimento representações da solidão, da guerra, da morte, da libertação dos homens e da palavra, da dor, da dificuldade em falar, chorar e amar, ao lado da ideia de que, ainda sim, é possível suportar o “peso do mundo” e continuar vivendo. Para além disso, é igualmente possível traçar uma linha do tempo nos poemas, visto que eles trazem imagens do passado, do presente e, ainda, do futuro, numa ponderação sobre uma constante passagem, não só ela historicizada por fatos externos, mas também refletida no eu que enuncia, demonstrando, de alguma maneira, certa transição do poeta.
Palavras-chave:
Drummond; poesia; dualidades.
Canto órfico ou a poética das imagens
Gustavo Osório (UFSC)
O
presente trabalho tenta por meio de uma aproximação crítica do poema Canto
Órfico (1954)de Carlos Drummond de Andrade, estabelecer uma ponte
interpretativa com a revista Colombiana Mito(1955), revista cultural e
literária (à qual ele pertenceu e contribuiu como membro do comitê editorial) e
assim apresentar uma cena de leitura que estabeleça relações e concomitâncias
estéticas, a maneira de dialogo construtivo, não só com o suplemento senão
também fazer uma leitura constelacional de diversas poéticas modernas,
presentes em outras publicações ou revistas como é o caso da revista cubana
Orígenes (1944) dirigida por Lezama Lima, quem aponta por meio do imaginário
poético Paulvaleriano uma convergência destas diferentes poéticas que empregam
o uso da imagem como ferramenta chave à hora de criar suas artes literárias,
que embora distantes no tempo e no espaço e tenham diferencias criativas e
certo distanciamento poético, colocam a imagem no centro do seu cosmos de
criação e coincidem sintomaticamente nas suas propostas estéticas que,
diversas, potenciam uma fértil análise e uma leitura que coloca em questão o
devir da poética latino-americana (pensando o Brasil junto) como um frutífero
cenário de critica e debate, pensando o literário como um espaço onde se entrecruzam
e geram-se uma amalgama de sentidos presentes na poesia.
No
texto se indaga a noção de mito presentes tanto no poema quanto na revista do
mesmo nome, por sua vez, se estabelece um paralelo com a revista cubana
Origenes, sublinhando os pontos de encontro,interseções da poesia brasileira, a
cubana e a proposta estética da revista colombiana; para isto se faz uso das
propostas teóricas de Roland Barthes no seu texto Mitologias (2003) e em
Lettura del «Bateau ivre» di Rimbaud (1996) Onde Furio Jesi faz a introdução e
apresenta sua noção de maquina mitológica. Por sua vez a traves de Lezama se
questiona a idéia de imagem que pode nos cutucar na poesia, por meio da sua
força visual
A escrita a partir da pedra
Rodrigo Brasil (UFSC)
No
meio do caminho tinha uma pedra. Tinha uma pedra no meio do caminho. Mas isso
nunca foi obstáculo para Drummond escrever sua poesia. Pelo contrário, podemos
mesmo pensar que essa consciência crítica do poeta sobre as dificuldades e
vicissitudes da condição humana e da criação artística foi a pedra de toque ou
a pedra fundamental que lhe permitiu, desde o seu primeiro livro, Alguma
Poesia, publicado 1930, escrever com agudeza e radicalidade, em consonância com
os paradigmas da modernidade.
Antonio
Candido identifica uma inquietude constante na poesia de Drummond, em que a
força dos problemas (ou dos temas) é tão intensa que o poema parece crescer e
organizar-se em torno deles, como arquitetura que os projeta.
Drummond
tem consciência de que nossa relação com o mundo é mediada pela subjetividade e
pela linguagem. Esse percurso entre o eu e as coisas se tornou ainda mais
problemático na modernidade, em que se instaurou a chamada “crise da
representação”, problematização em torno do vínculo entre os signos e a
realidade, a palavra e as coisas, o significante e o significado. Pode-se
pensar que essa desconfiança crítica, que remonta ao século XIX, no início da
Idade Moderna, está na origem do caráter moderno da arte.
Nessa
perspectivas as palavras se tornaram símbolos ambíguos e pouco confiáveis.
“Vivemos dentro da linguagem como aspiramos o ar poluído”, observa Guy-Ernst
Debord. Um poeta que hoje não demonstre em seu trabalho a questão da
representação devidamente problematizada e tensionada está sujeito a parecer
alheio às questões de seu tempo. Em sua dureza de pedra, Drummond parece
considerar o obstáculo e a inadequação como características da própria condição
humana (e social). Segundo observa Candido, a sociedade oferece ao poeta
obstáculos que impedem a plenitude dos atos e dos sentimentos. As relações
humanas parecem para ele dispor-se num mundo igualmente torto. O indivíduo
sente-se desajustado na sociedade, que o condiciona e da qual não consegue
escapar. A pedra no caminho pode sugerir uma subjetividade que enfrenta o problema
de estar separado do mundo, e a pedra em questão representa uma barreira entre
a subjetividade e a realidade objetiva do mundo que nos cerca. Essa condição se
agrava ainda mais porque a poesia é feita de palavras, que são capazes de
representar o mundo, mas não de romper a distinção que as palavras guardam com
as coisas. A palavra não é a coisa, mas representa as coisas; a insuficiência
da palavra para ser a coisa pode ser vista como uma pedra no caminho. Mas ao
alcançar o estado de poesia a palavra se torna uma coisa nova, ainda em relação
com o mundo, mas não submetido a ele. A poesia é, portanto, uma força e um
campo de conhecimento. Ele não se limita a representar o mundo, ele inaugura
seu próprio mundo, a partir do poema.
Palavras-chave:
Carlos Drummond de Andrade; crise da representação; modernidade.
A perspectiva das guerras segundo Goya, Picasso, Delacroix e
Drummond
Claudineia
Aparecida do Nascimento (UEM)
Este trabalho tem por objetivo apresentar
resultados de análises de diferentes linguagens verbal e não-verbal e
identificar as marcas que justifiquem os intertextos, bem como, analisar os
aspectos dialógicos entre as telas e os poemas que confluem para a temática da
guerra, observando seus diferentes períodos e contextos históricos. A primeira
tela analisada será A liberdade guiando o povo, de Delacroix, que tem como
contexto histórico A Revolução de Julho de 1830; a segunda, será O fuzilamento
em 3 de maio , de Goya, está tem como pano de fundo a Revolução Espanhola de
1808; já a terceira, intitulada Guernica, é a famosa obra de Picasso, inspirada
na Guerra Civil Espanhola. Fortalecendo a temática escolhida, em outra
linguagem, destacamos os poemas Cidade prevista e Telegrama de Moscou, ambos do
livro A Rosa do Povo, de Carlos Drummond de Andrade. Estabelecer as relações
entre os impactos provocados pelas guerras e a postura ética de resistência e
utopia, explicitamente marcadas nas diferentes linguagens, é necessário para a
melhor compreensão das obras aqui selecionadas. A linha de trabalho procederá
pela investigação das guerras, classes sociais, fenômenos ou fatos, com vistas
a ressaltar as diferenças e similaridades entre esses elementos envolvidos com o
contexto de cada uma das obras. A fundamentação teórica terá como ponto de
partida a linguagem como processo de interação verbal, postulada por Bakhtin.
Para as análises, utilizaremos os estudos de Candido (1993) e Bosi (1977) e
(2000).
Mesa de Comunicações n.3:
Retrato empoeirado: a fragilidade da fotografia como registro
da memória em "Retrato de família" de Carlos Drummond de Andrade
Mariane Pereira Rocha (UFPel)
Este
trabalho se propõe a estabelecer uma reflexão sobre a possibilidade de diálogo
da fotografia com a poesia em Carlos Drummond de Andrade. Entendendo a
fotografia como fenômeno multifacetado que pode se apresentar em diferentes
formas, mobilizando diversas técnicas e linguagens, bem como possuir inúmeros
usos sociais e culturais (desde registro mimético e documental da realidade a
uma forma de criação artística já inquestionavelmente reconhecida), nesta
pesquisa nos deteremos na fotografia como dispositivo que propicia capturar e
fixar o tempo passado. Com o apoio do pensamento de Benjamin, Barthes e Sontag
acerca da linguagem fotográfica, que apontam para uma problematização dessa
captura e fixação da memória, analisamos o poema “Retrato de família” de A rosa
do povo (1945) a fim de entender de que modo o poema se apropria da linguagem fotográfica
e de seus usos culturais. Nossa proposta de investigação é a de que nesse poema
a referência à fotografia tem por efeito subverter o discurso normalmente
associado ao uso cultural dos álbuns de família, qual seja, a crença da qual
nunca se desconfia de que a foto “preserva” o passado de forma fidedigna, de
modo a se poder recuperar aquele tempo passado intacto, posto que fixado na
imagem fotográfica. Drummond, na contramão desse discurso, lança um olhar
desconfiado sobre essa promessa da fotografia, apresentando-a como um arquivo
frágil e, assim como os demais arquivos que têm como função o registro da
memória, falível. O poeta vislumbra no retrato empoeirado da família justamente
a impossibilidade de a fotografia dar conta das lembranças do passado: as
“viagens que os tios fizeram” ou o “quanto de dinheiro o pai ganhou” emergem no
presente de quem olha a fotografia como imagens de um passado deteriorado pelo
próprio tempo. Isto posto, acreditamos que a apropriação da fotografia pela
lírica drummondiana pode ser estendida para a discussão das funções do lembrar
e do esquecer, dos dispositivos da memória e dos sentidos do arquivo.
Drummond e o seu papel no espetáculo teatral "Ser Minas
tão Gerais"
Amanda
Guimarães Tito (UFES)
O
presente trabalho é parte do desenvolvimento de uma dissertação de mestrado que
investiga a contribuição da poética literária de Carlos Drummond de Andrade
para a construção cênica do espetáculo musical Ser Minas Tão Gerais, montado
pelo grupo teatral Ponto de Partida, da mesma terra natal do poeta - Minas Gerais.
A
partir deste estudo, é possível identificar claramente no musical Ser Minas Tão
Gerais, certos poemas de Drummond atuando como condutores da narrativa e,
outros, como elementos dramatúrgicos em cena, nos signos e em seus próprios
versos recitados por atores-cantores, o que evidencia o papel fundamental de
determinadas obras de Drummond para a construção cênica desta peça musical.
Foi
utilizado como instrumento do objeto de estudo o conteúdo audiovisual em DVD –
comercializado pelo grupo teatral e que é produto da gravação de uma
apresentação deste espetáculo ocorrido em Belo Horizonte no ano de 2004. Por
meio dele, foi iniciado o trabalho de observação e análise do espetáculo
gravado, para o desenvolvimento da pesquisa. As Obras Drummonianas presentes no
espetáculo Ser Minas Tão Gerais são analisadas e confrontadas pela forma em que
são transpostas em signos e representadas dramaticamente, tendo os estudos
semiótico e dramatúrgico como importantes referenciais teóricos. Além disso, os
versos e fragmentos de poemas de Drummond unem-se aos das lavadeiras do Vale do
Jequitinhonha, dando liberdade e inspirando sapateados, congadas, catiras e
samba no pé, misturados aos arranjos vocais sofisticados e a meras folhas de jornal
que se transformam em igrejas, rios, casas... “Cidadezinha qualquer”, “Uma
pedra no meio do caminho”, “Canção para ninar mulher”, “O amor bate na aorta”,
“O vôo sobre as igrejas” são alguns dos poemas que resgatam a memória de um
povo, aliados a músicas do também mineiro “Milton Nascimento”, como a “Canção
amiga”, que o cantor criou inspirado no poema de Drummond. A poética e as
memórias de Drummond, por meio do espetáculo “Ser Minas tão Gerais”, já
alcançou mais de 40 mil pessoas, em todo o país, e também alcançou o Théâtre
des Chamos Élysées, em Paris, onde foi lançado o DVD do presente musical.
Palavras-chave:
teatro brasileiro; Drummond; Ser Minas tão Gerais
Imagens da figura feminina na poética de Carlos Drummond de
Andrade
Júnia
Laise Scheunemann Engel (UNOCHAPECÓ)
Atualmente,
tem-se discutido muito a respeito do papel da mulher na sociedade, a busca pela
emancipação, bem como sua mudança de comportamento ao longo dos tempos, tais
fatos são notados também na literatura. Diante desta temática, o objetivo
central do presente trabalho é ler quatro poemas de Carlos Drummond de Andrade,
a fim de conhecer como se constitui a imagem da figura feminina nesses textos.
Bem como, a partir da história da literatura, recobraremos as diferentes
configurações da mulher. Drummond ocupa lugar de destaque na Literatura
Brasileira, a qual legou uma extensa produção marcada pela magnitude
intelectual e riqueza humana. Devido a universalidade de sua poesia, seus
textos continuam presentes em nosso cotidiano, razão essa que merecem um estudo
mais atento. A pesquisa foi feita a partir de um levantamento bibliográfico e
análise dos seguintes poemas: Iniciação Amorosa (Alguma Poesia - 1930), Cabaré
Mineiro (Alguma Poesia- 1930), Desdobramentos de Adalgisa (Brejo das Almas -
1934) e Caso Pluvioso (Viola de Bolso - 1952) de Carlos Drummond de Andrade.
Palavras-chave:
Personagem feminina. Literatura Brasileira. Carlos Drummond de Andrade.
Faraday: precursor da máquina itabirana
Iran Silveira (UFSC)
O lisboeta Camões, como típico homem de letras do século XVI, tinha bom
conhecimento dos avanços científicos de sua época, como a astronomia de
Copérnico, por exemplo. O itabirano Drummond, homem de letras do século
XX, não tinha tanto interesse por ciências exatas, e daquelas de seu
tempo menos ainda, e este é um dos motivos pelos quais os retratos da
máquina do mundo dos dois poetas sejam tão diferentes. Ao não aludir a
qualquer conceito da Física em seu poema, evitando mesmo descrever a
máquina, Drummond envolve o cenário numa aura de mistério. Sabemos
apenas que de uma abertura no artefato o eu lírico goza de diversas
visões maravilhosas. Se relacionarmos as experiências vistas em uma
estrada pedregosa de Minas com experiências então recentes na Física, e
que certamente não existiam na época de Camões, poderíamos chegar, por
exemplo, a estudos como o do eletromagnetismo, da luminescência e o
experimento conhecido como a Gaiola de Faraday. Para isso, estabeleçamos
que Drummond adentrou de corpo todo na máquina para ter suas visões, e
não que olhou por uma abertura – embora não fique claro no poema se ele
entrou ou não entrou nela. O que é claro é que o objeto não emitiu
qualquer som “que fosse impuro/ nem um clarão maior que o tolerável”.
Dentro da gaiola metálica que o inglês Michael Faraday projetou em 1836,
Drummond poderia ter sentado numa cadeira de madeira e recebido uma
descarga elétrica, sem, entretanto, a sentir. O fato de que anoitecia
poderia explicar as visões, uma vez que no lado de fora da gaiola são
emitidas descargas de alta tensão (que visualmente se assemelham a
pequenos relâmpagos); e o fenômeno da luminescência, ou radiação
luminosa eletromagnética provocada por reações químicas, poderia
produzir diversas luzes coloridas. O restante (pontes, edifícios,
abstrações) facilmente poderia ter saído da imaginação de um interiorano
assustado ou fascinado, da mesma maneira como tantas lendas de seres
fantásticos e bolas de fogo foram contadas por pessoas – inclusive
mineiras, se deduz – com juras de verdade.
Palavras-chave: Poesia. Física. Folclore.